“O Brasil voltou” ao Parlamento do mundo (por Felipe Sampaio) – Metrópoles
Metropóles
atualizado
Para alguns comentaristas o presidente Joe Biden parecia disperso em seu discurso na abertura da Assembleia Geral da ONU. Contudo, é pouco provável que a maior potência da história tenha como dirigente alguém desatento aos desafios globais do momento.
Biden optou por um estilo anfitrião elegante, sem deixar de defender dois os eixos que condicionarão o desenvolvimento humano e a geopolítica nas próximas décadas.
O primeiro eixo tem caráter multilateral e diz respeito ao enfrentamento da crise climática, sem descuidar do aspecto social. Nas palavras de Biden, isso exigirá “um compromisso de preservar o planeta e proteger a dignidade humana”.
O outro eixo destacado pelo presidente democrata tem dimensão política estrutural: “A democracia precisa entregar melhorias de qualidade de vida às pessoas”.
O recado de Biden confirma a opinião do cientista político Oscar Medeiros Filho em seu artigo Sustentabilidade Socioambiental e Segurança Multidimensional (Revista Diálogos Soberania e Clima, Nº 8, 2023).
Medeiros Filho ensina que “a convergência entre Segurança Nacional e Segurança Humana é condição fundamental para o sucesso ao enfrentamento às mudanças climáticas e para a sustentabilidade socioambiental e soberana dos Estados Nacionais”.
No mesmo sentido, o discurso do Presidente Lula, inaugurando o mesmo evento da ONU, botou um olho nas mudanças climáticas, outro nas questões sociais internas e os dois olhos na soberania nacional (leia-se nova ordem geopolítica).
Na mesma viagem, nosso Ministro da Fazenda aproveitou para anunciar o lançamento de Títulos Verdes para captar US$2 bilhões em investimentos sustentáveis, sinalizando o esforço inteligente do Brasil na promoção de um capitalismo responsável, sob os pontos de vista social e ambiental.
Enquanto Haddad acenava ao mundo com uma importante medida de prevenção e desaceleração do aquecimento global, o Presidente Lula participou do encontro do G77 em Cuba, deixando claro que há limite para o avanço dos interesses estrangeiros sobre os valores progressistas do governo brasileiro e a soberania nacional.
Não dá para ignorar que, goste-se ou não, “o Brasil voltou”. A sintonia na movimentação do Planalto, do Itamaraty e da área econômica revela uma retomada das relações internacionais sem se prender a alinhamentos bilaterais apaixonados.
O governo abriu diálogo amplo e franco com EUA, China, Rússia, Ucrânia, Noruega, Alemanha, União Europeia e América Latina, no bom estilo da diplomacia brasileira. Ao mesmo tempo, assumiu a coordenação do Mercosul, a presidência do G20, emplacou a presidência do Banco do BRICS e quer receber a COP30 no coração da Amazônia.
Não foi à toa que Biden mostrou-se favorável a reformas no Conselho de Segurança da ONU, defendendo “mais vozes, mais perspectivas na mesa”, em convergência com a proposição de Lula. Um feito que colocaria o atual líder estadunidense à frente do seu colega Barack Obama (que não foi muito além do gracejo “you are the guy”).
Se os discursos de velhos líderes parecem repetitivos, é porque os problemas são mais velhos ainda. O Secretário-Geral Guterres arremata a interpretação da realidade: “o que define nossa época é a desigualdade”. Contudo, é possível perceber que, para os novos e os antigos problemas, já se apresentam novas compreensões e propostas.
Felipe Sampaio: chefiou as assessorias dos ministros da Defesa (2016-2017) e da Segurança Pública (2018); cofundador do Centro Soberania e Clima; foi secretário-executivo de Segurança Urbana do Recife; atual diretor do SINESP no Ministério da Justiça e Segurança Pública.
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